Dificuldade no escoamento da geração por parte das renováveis deve ser ponto de atenção para quem deseja investir no setor solar fotovoltaico
O aumento da participação de fontes renováveis no mundo vem trazendo grandes desafios para os sistemas de transmissão. No Brasil, o que acontece com a Rede Básica não é diferente. A grande quantidade de projetos em desenvolvimento e a baixa capacidade de escoamento devido a uma infraestrutura de transmissão insuficiente no momento é um ponto de atenção para quem deseja investir no mercado fotovoltaico.
O Estudo Estratégico Grandes Usinas Solares 2023 indicou que até fevereiro a potência de projetos solares outorgados atingiu o montante de 86 GW, dos quais 73,6 GW (85%) ainda não haviam iniciado a construção. Dentre os pontos de atenção para os projetos futuros, o desafio em relação à conexão na rede é um dos principais.
Desse montante com construção não iniciada, 39 GW possuíam pareceres de acesso emitidos, mas parte deles condicionados à disponibilidade de margem futura no Sistema Interligado Nacional (SIN), uma regra definida pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Essa margem é a folga no sistema de transmissão para acomodar uma quantidade adicional de geração em um ponto de conexão.
Finalmente, dentre os 39 GW com pareceres de acesso emitidos, 27 GW possuíam Contrato de Uso do Sistema de Transmissão (CUST) assinado, mas em parte com restrições operativas que poderiam impactar a viabilidade do empreendimento.
Relação entre o aumento no número de projetos e o fim do desconto na Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e Distribuição (TUSD)
As fontes renováveis ganharam um desconto de 50% nas Tarifas de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e de Distribuição (TUSD) por meio da Lei nº 13.203/2015. Por sua vez, a Lei nº 14.120/2021 formalizou o fim da concessão desses descontos, mas prevendo um período de transição.
Os empreendimentos que requeressem outorga junto à Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) até 2 de março de 2022 e entrassem em operação comercial em até 54 meses, de acordo com a Resolução Normativa nº 1.038/2022, ainda teriam direito ao benefício. Assim, houve uma grande busca pelos requerimentos de outorga por parte dos empreendedores que desejavam o desconto, mas que esbarrava na necessidade das informações de acesso/conexão ao sistema de transmissão e distribuição, emitidas pelo ONS ou pelas Distribuidoras.
Porém, no fim de 2021, o Decreto nº 10.893/2021 permitiu que a solicitação dessas outorgas pudessem ser realizadas sem essa necessidade do documento de acesso/conexão. Assim, muitos projetos estão outorgados, mas sem a garantia de conexão.
Números que descrevem as restrições no escoamento
O Sumário Executivo do Plano da Operação Elétrica de Médio Prazo do SIN (PAR/PEL) do ONS ilustra o avanço da geração renovável ao apontar que até o final de 2026 a capacidade total do SIN seria de 259,7 GW na hipótese de que todos os projetos com pareceres de acesso válidos ou em andamento fossem conectados, além dos que já possuem CUST assinado. Desse total, 95,2 GW (36%) de usinas eólicas e fotovoltaicas.
Apesar de uma grande participação das renováveis, essa versão do PAR/PEL, referente ao Ciclo 2023-2027, apontou 507 empreendimentos com problemas para atendimento à carga e escoamento da geração. Dentre eles, 200 são associados à restrição de escoamento de geração ou intercâmbio de energia, um aumento de 45% com relação ao último ciclo do PAR/PEL.
Além disso, apesar de uma evolução nos limites de transmissão entre as regiões Norte/Nordeste e Sudeste/Centro-Oeste, considerando usinas com CUST assinado e pareceres de acesso válidos ou em andamento, o Operador identifica restrições para o escoamento de geração das regiões Norte e Nordeste. A sobra de potência devido às restrições pode atingir valores da ordem de 12,9 GW em 2023 e 17,6 GW em 2027.
O caso de Minas Gerais é ressaltado no PAR/PEL, tendo em vista o alto montante de geração em operação ou com CUST assinado, além do grande número de pareceres de acesso emitidos ou em andamento. Esses projetos já apontam um esgotamento do sistema de transmissão licitado para a região que tem previsão de entrada em operação em 2027.
Investimentos em expansão e outras soluções para lidar com este cenário
Como forma de aumentar a capacidade de transmissão, em outubro ocorrerá o Leilão de Transmissão nº 2/2023. São esperados três lotes para a construção e manutenção de 4.471 km em linhas de transmissão e de 9.840 MW em capacidade de conversão nas subestações. Goiás, Maranhão, Minas Gerais, São Paulo e Tocantins serão os estados que receberão as obras.
Para os próximos anos, de acordo com o Programa de Expansão da Transmissão (PET), elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), dos R$ 99,4 bilhões previstos em investimentos para o período de 2021 a 2026, R$ 73,0 bilhões (73%) se referem a investimentos em obras planejadas originalmente com o propósito de escoamento da geração.
Já o conjunto de obras indicado no ciclo do PAR/PEL 2022, entre 2023 e 2027, indica em torno de 16.000 km de novas linhas de transmissão e 34.000 MVA de capacidade transformadora adicionada por meio de subestações novas e existentes. Isso representa um acréscimo de 10% na extensão das linhas de transmissão e de 9% na potência nominal instalada em transformadores da Rede Básica e Rede Básica de Fronteira.
Segundo o PAR/PEL, Bahia e Minas Gerais são os estados que mais concentrarão investimentos na rede, seguidos do Maranhão, Goiás e Piauí. Considerando obras de expansão do sistema outorgadas, é esperado um ganho de 3,3 GW na capacidade de exportação da Região Nordeste e 2,4 GW de transferência do Nordeste para o Sudeste.
Além dos leilões tradicionais, os órgãos do setor planejam o leilão de margem de escoamento por meio da indicação e competição por barramentos, no intuito de dar vazão aos projetos de fontes renováveis que demandam conexão ao sistema. O Ministério de Minas e Energia (MME) pretendia realizar o leilão no primeiro semestre de 2023, porém, o certame ainda carece de maiores definições.
Em 9 de maio de 2023, a ANEEL decidiu abrir Consulta Pública (CP) para obter subsídios referentes à proposta de tratamento excepcional na gestão de outorgas de geração e dos CUST assinados. A proposta da Agência é uma rescisão amigável de CUST celebrados por geradores que não terão seus projetos de fato viabilizados. A adesão seria voluntária e traria a anistia de eventuais multas aplicadas pela fiscalização, devolução das garantias de fiel cumprimento e não aplicação de encargos de rescisão do CUST.
Por outro lado, para aderir à proposta, os agentes de geração não podem ter débitos de Encargos de Uso do Sistema de Transmissão (EUST) devido às transmissoras até o final do ciclo tarifário, débitos de encargos setoriais e Contratos de Compra de Energia no Ambiente Regulado (CCEAR), além de ter que renunciar à qualquer discussão judicial envolvendo CUST celebrados.
A ANEEL espera, dessa forma, diminuir a fila do acesso à transmissão por meio da rescisão de mais de 17 GW de outorgas de empreendimentos que não tiveram sua construção iniciada e, assim, liberar margem de escoamento para projetos que possuem viabilidade.
A CP ficará aberta para contribuições entre os dias 11 e 21 de maio de 2023.
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A ampliação da disponibilidade de acesso à rede de transmissão tem sido uma preocupação constante de empreendedores do setor, à medida em que a dependência da conectividade se torna cada vez mais crítica principalmente para o avanço das renováveis.
Nesse contexto, o Greener Summit 2023 contará com palestras que abordarão essa temática, passando pelas perspectivas regulatórias, leilões de transmissão e de margem de escoamento, o que se espera de demais iniciativas dos órgãos do setor elétrico e, principalmente, como os projetos deverão se comportar para lidar com a alta concorrência no processo de conexão e garantir a viabilidade dos investimentos.
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